O Hyundai Nexo é um SUV movido a hidrogénio. A prova de que é possível, já hoje, utilizar este combustível para um veículo de emissões zero.

Às vezes acontece sentirmos que estamos a experimentar algo que vai mudar as nossas vidas de forma significativa. Depois que estudar em detalhe e escrever sobre o hidrogénio — e o papel que poderá ter no futuro da mobilidade — pude ensaiar, sem restrições, um automóvel que usa este combustível. 

Foram vários os construtores que, ao longo das últimas décadas, testaram o sistema da célula de combustível. Os construtores japoneses e alemães, em particular, continuam a investir no desenvolvimento desta tecnologia. 

Preparam-se para a introduzir comercialmente em utilizações específicas. Mas foi a Hyundai que comercializou o primeiro automóvel a hidrogénio, o SUV ix35.

O Nexo é, pois, um produto de segunda geração, beneficiando de grande experiência adquirida com o modelo anterior.

Ao contrário daquele, o Nexo foi concebido para ser um veículo Fuel Cell. Esta abordagem permitiu a maximização de espaço, peso e arrumação de todos os componentes. 

É provável também que tenha vantagens específicas em termos de segurança, mas a Hyundai não revelou ainda estes dados.

Um produto cuidado

O Nexo foi objeto de particular atenção em termos aerodinâmicos. Tal é visível nas entradas de ar laterais na aba dianteira, nas jantes e nas aletas do pilar traseiro, que aceleram o ar para a secção posterior. 

Uma carenagem inferior concorre também para o menor atrito possível, bem como os puxadores de porta escamoteáveis. Um pormenor premium que também oferece menos resistência aerodinâmica. 

Com um coeficiente de penetração ligeiramente inferior a 0,33, o Nexo tem um desempenho muito competente para um SUV destas dimensões.

O interior é espaçoso e muito bem conseguido, sobretudo, para quatro ocupantes. 

No nosso ensaio estava apenas disponível a versão cinzento mate, com interior em cinzento claro.

O design da consola horizontal e muito atraente e acaba por ser bastante intuitivo. Na prática, vários comandos estão dobrados, entre o ecrã tátil e os botões, o que pode incomodar quem leve mais à letra um espírito minimalista.

Alguns revestimentos utilizam materiais ecológicos. Salta à vista o ecrã tátil multi-funções de 12,3’’. À frente do condutor existe um segundo ecrã com 7’’.

A “caixa” — de uma velocidade e marcha-atrás — é comandada por quatro botões. Para além do sentido do movimento (D para a frente, R para trás), temos um P e um N, com as mesmas competências que lhes são atribuídas numa caixa automática convencional.

O mesmo sistema é utilizado nos Ioniq Electric e Kona/Kauai Electric.

Tecnologia nova

O sistema de pilha de combustível do Nexo é novo e totalmente produzido pela Hyundai.

O construtor coreano assegura uma fiabilidade equivalente à de um automóvel com motor de combustão. A Hyundai garante o sistema de pilha de combustível do Nexo durante 10 anos ou 160 000 quilómetros.

Segundo o fabricante, o sistema atual é 20% mais leve e 10% mais eficiente do que o seu antecessor. O conjunto pilha de combustível e tanques de hidrogénio pesa 200 kg.

Os três depósitos têm uma capacidade combinada de 156,6 litros de hidrogénio pressurizado, o que equivale pouco mais de 6 kg de peso.

A comercialização do hidrogénio também é habitualmente feita ao quilo, bem como a análise dos consumos.

A Hyundai afirma que o Nexo tem uma eficiência de 60%, a nova referência deste tipo de sistemas de célula de combustível. Tal equivale a um consumo anunciado de 0,95 kg de hidrogénio por cada 100 km. 

Segundo as mais rigorosas normas de cálculo do WLTP, a autonomia do Nexo é de 666 km.

Uma condução relaxada

O Nexo tem uma carroçaria típica de um SUV e um peso próximo dos 1900 kg em estado de marcha.

Na prática, o motor de combustão interna é substituído pelo complexo sistema de pilha de combustível, cujo peso é apenas um pouco superior. 

Por isso, o comportamento geral do Nexo é comparável a um SUV convencional. Já a resposta do motor e a ausência de interrupções no progresso — pela ausência de uma caixa de velocidades — é típica de um veículo elétrico. 

Onde se afasta mais dos VE atuais é no facto de ser bastante mais lento. A potência máxima do seu motor único de magneto permanente é de 120 kW ou 163 cavalos.

Acelerações dos 0-100 km/h em 9,2 s. e recuperações de 80 a 120 km/h em 7,4 s. são apenas razoáveis. Já a velocidade máxima de 179 km/h é perfeitamente aceitável. 

Quanto ao comportamento, o amortecimento suave e peso elevado incitam a uma condução suave. O Nexo é um automóvel confortável para viagens longas a ritmos moderados.

No meu ensaio, que durou quase hora e meia, aventurei-me por algumas estradas secundárias, onde pude aprofundar as qualidades dinâmicas do Nexo. 

Achei os travões competentes, com boa modulação. Mesmo em percursos mais sinuosos, não há quebras de tração significativas, com a entrega de potência às rodas da frente sempre linear e suave. Só em transições acentuadas de apoio se notam as limitações do peso e do acerto de suspensão mais macio.

Um laboratório rolante

A sua condução pode não entusiasmar, mas o mesmo não pode ser dito da sua tecnologia embarcada.

O Nexo está preparado para um desempenho autónomo de nível quatro, patente em alguns dos seus sistemas avançados de assistência à condução.  

Este novo porta-estandarte da gama ecológica Hyundai estaciona sozinho (Remote Smart Parking Assist). Consegue manter-se sozinho na faixa de rodagem (Lane Following Assist e Highway Driving Assist). Outra inovação é a imagem de ângulo morto captada por câmaras na traseira e transmitida para o ecrã do condutor (Blind Spot View Monitor).

Tem ainda sistemas mais convencionais, para evitar atropelamento, controlar os faróis, manter o condutor atento e outros já disponíveis na gama Hyundai.

Através do ecrã tátil principal é possível acompanhar todo o processo levado a cabo pelo sistema de pilha de combustível. O hidrogénio contido nos depósitos passa por um processo químico que permite criar eletricidade e enviá-la para a bateria de alta tensão e para o motor.

Tive também a oportunidade de reabastecer o Nexo numa estação de hidrogénio. Depois de estabelecermos um protocolo de pagamento, podemos pegar na agulheta.

Esta é um pouco diferente da utilizada para a gasolina ou gasóleo e é mais semelhante á de GPL. Quando inserimos a agulheta, esta prende, para garantir que a transferência do hidrogénio é realizada sem fugas.

Em pouco mais de cinco minutos, o depósito ficará cheio. O sistema avisa-nos quando podemos remover a agulheta e fechar a tampa de acesso aos depósitos.

Equipamento e preço

O Hyundai Nexo vai ser vendido um pouco por todo o mundo, mas em mercados selecionados. Um dos requisitos essenciais é a existência de um rede de abastecimento de hidrogénio.

O sistema de pilha de energia exige que o hidrogénio utilizado tenha um grau de pureza quase perfeito (99,99%). 

O primeiro mercado na Europa será a Noruega, onde tive a oportunidade de realizar este ensaio.

A Islândia, o Reino Unido, a Holanda e a Alemanha serão também mercados naturais para o Hyundai Nexo. Já receberam o seu sucessor, ix35.

Na Noruega já existem preços. Ao câmbio atual, o Nexo vai custar 61 435 euros. A pintura mate do exemplar ensaiado custa mais 933 euros. Para além da pintura metalizada (514 euros), não existem outros opcionais.

Na Holanda, também já está em comercialização e custa 69 995 euros. Na Alemanha, custa 69 000 euros.

Para já, não está prevista a sua comercialização em Portugal.

A opinião do Welectric

A Hyundai está de parabéns com o Nexo. É um automóvel competente, confortável e fácil de utilizar. É também um feito tecnológico muito importante. 

Alguns estudos apontam para um mix de motorizações em 2040 que separa em quatro partes iguais os Elétricos (BEV), os motores de combustão (ICE), os híbridos (HEV e PHEV) e a célula de combustível (FCV).

A Hyundai revelou que quer estar preparada para essa eventualidade, com produtos competitivos.

Dito isto, o hidrogénio enfrenta obstáculos significativos para a sua utilização na mobilidade. 

A infra-estrutura é necessária a vários níveis. Na produção, no transporte, no armazenamento e no fornecimento ao utilizador final. Perdas energéticas e custos estão associados a cada um destes momentos. 

O hidrogénio pode ser produzido de diversas formas, mas aquela que faz mais sentido em termos ambientais é através da electrolise da água. Para este processo é preciso energia elétrica, produzida através de fontes renováveis. Neste momento, para produzir um quilo de hidrogénio, são necessários 35 kWh.

Com um quilo de hidrogénio, um bom fuel cell pode percorrer 100 km. Mas com 35 kWhh, um elétrico (BEV) pode fazer entre quase 200 a 300 km.

Neste momento, um quilo de hidrogénio custa, sem subsídios, perto de 9/10 euros. Para comparar de forma mais favorável com os automóveis com motores de combustão (de aquisição mais barata), ainda precisa de baixar mais.

Mas rivalizar com os BEV, à medida que estes aumentam as suas autonomias, poderá ser ainda mais difícil.


Ficha técnica

Motor: Sistema Fuel Cell de hidrogénio, com motor elétrico de Magneto permanente síncrono, 120 kW (163 cv); 395Nm de binário instantâneo;

Transmissão: rodas dianteiras. Tipo automático, uma velocidade.

Chassis: carroçaria monobloco, de 5 portas e 5 lugares

Dimensões: comprimento: 4670mm; altura: 1630mm; largura: 1860; distância entre eixos: 2790mm; Peso: 1873 kg

Velocidade Máxima: 179 km/h

Aceleração 0-100 km/h: 9,2 s.

Consumo (hidrogénio): 0,95 kg/100 km

Autonomia: 666 km (WLTP) ou 756 km (NEDC)

 

Artigo anteriorComitiva de Marcelo Rebelo de Sousa andou de elétrico na Madeira
Próximo artigoMáquina de café portátil com autonomia energética: inovação nacional até pode ir para o espaço