Um estudo, publicado no Journal of Animal Ecology, demonstra que o impacto da produção de energia eólica na vida selvagem pode ser maior do que se pensava.

De acordo com a pesquisa, uma área com cerca de 650 metros a 700 metros de raio à volta de cada turbina eólica é espaço de voo perdido para as aves planadoras, categoria que inclui cegonhas, grous e aves de rapina diurnas.

A investigação foi liderada por Ana Teresa Marques, estudante de doutoramento em Biodiversidade, Genética e Evolução no Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais – cE3c (da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa).

Este estudo foi desenvolvido em parceria com o Instituto Max Planck de Ornitologia (Alemanha), envolvendo investigadores da Universidade de Lisboa, Universidade do Porto, Universidade Federal do Pará (Brasil), Universidade de Málaga (Espanha), Instituto Norueguês para Investigação da Natureza, Universidade de Konstanz (Alemanha) e Fundação Migres (Espanha).

Os investigadores recomendam, por isso, o desenvolvimento de novas medidas reguladoras que permitam conciliar a conservação da vida selvagem com a produção de energia eólica em áreas importantes para a migração destas aves.

Ao seguirem com equipamento GPS de alta-precisão o voo de 130 milhafres-pretos (Milvus migrans) numa região povoada por turbinas eólicas, em Tarifa (sul de Espanha), e modelarem quais as áreas mais utilizadas por estas aves tendo em conta as condições do vento e do relevo, os investigadores verificaram que as turbinas eólicas causam uma perda significativa de espaço de voo para estas aves.

“Os resultados demonstram que em torno de cada turbina eólica existe uma área com cerca de 650 m a 700 m de raio que é menos utilizada do que o esperado, tendo em conta o seu potencial. Esta perda de habitat pode ser particularmente relevante para as aves planadoras, que no seu voo de migração estão restritas a utilizar áreas com condições de vento específicas. Para estas aves, pequenas perdas de área adequada de voo podem ter um grande impacto na sua viagem migratória”, refere Ana Teresa Marques.

“é importante conciliar a produção de energia eólica com a conservação da vida selvagem”, diz Ana Teresa Marques.

O estreito de Gibraltar é uma região-chave para a migração de aves de toda a Europa. A equipa internacional de investigadores desenvolveu este estudo na região de Tarifa, no  lado espanhol do Estreito de Gibraltar, numa área de estudo que compreendia 160 turbinas distribuídas por sete parques eólicos. Para acompanhar o voo das aves, os investigadores utilizaram dispositivos de telemetria por GPS de alta resolução temporal (um ponto GPS a cada minuto) e precisão de 1,5 metros.

Para modelar as regiões mais favoráveis ao voo destas aves, isto é, com correntes de ar térmicas ou orográficas ascendentes, os investigadores utilizaram dados sobre o relevo e direção e velocidade do vento.

Este é o primeiro estudo que quantifica a proporção de habitat perdido ou negativamente afetado pela presença de parques eólicos para as aves planadoras em migração. E os investigadores estimam que a magnitude do impacto observado será semelhante em outras regiões do mundo importantes para as aves migratórias e onde estão a ser construídos grandes projetos de energia eólica, como no istmo de Suez, no Egipto, ou no istmo de Tehuantepec, no México.

“O nosso estudo demonstra que o impacto da produção de energia eólica vai muito além da mortalidade por colisão, que já tem vindo a ser reportada para aves e morcegos. Acreditamos que a produção de energia eólica é importante e necessária: recomendamos que as autoridades reconheçam este impacto alargado da produção de energia eólica e estabeleçam novas medidas reguladoras a aplicar em áreas importantes para a migração de aves planadoras que permitam conciliar a produção de energia eólica com a conservação da vida selvagem”, conclui Ana Teresa Marques.

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