Há cada vez mais evidências de que persiste uma fraca sensibilidade dos poderes públicos em relação à urgência de se atribuir prioridade a investimentos que promovam a gestão colaborativa dos espaços florestais do norte e centro do país, onde a pequena propriedade é dominante.
Dados de execução de 2.865 candidaturas do Programa de Desenvolvimento Rural para o Continente 2014-2020 mostram que continuam a prevalecer os investimentos direcionados para a região do Alentejo, onde o latifúndio com agricultura e pecuária são dominantes, com 46% do investimento contratualizado com os proprietários, sendo que se somarmos apenas as medidas dirigidas à beneficiação e produção a região do Alentejo fica com 65% do investimento.
Se tivermos em conta que o país necessita de dirigir rapidamente os seus investimentos florestais para as regiões Norte e Centro, onde existem problemas ligados à ausência de gestão colaborativa dos espaços dominados pelo minifúndio e que, por sua vez, são os territórios mais suscetíveis aos fogos rurais e onde existe maior necessidade de promover as espécies florestais autóctones, é incompreensível que perpetue esta má programação dos apoios.
Um dos exemplos disso é o escasso investimento em projetos relacionados com o aproveitamento da regeneração natural, nomeadamente, de pinheiro-bravo, espécie autóctone com futuro sombrio, mas indutora de uma economia rural que mantém 80% do emprego no setor industrial da floresta, tendo apenas sido identificados 62 projetos apoiados com 4,1 milhões de euros alocados.
No caso das outras espécies autóctones mais resistentes aos fogos, como os carvalhos, é possível que a situação seja tudo menos animadora.
Apoios do FFP desajustados à realidade
Mesmo os apoios à constituição de unidades de gestão florestal, atribuídos pelo Fundo Florestal Permanente (FFP) – uma das mais importantes medidas da Reforma da Floresta – apresentam resultados desastrosos: dos 500 mil euros disponibilizados, um valor que à partida já pareceria insuficiente, só 25% do valor total foi utilizado, isto é, as 28 candidaturas aprovadas receberam 128 mil euros.
E não é difícil perceber porquê. Se verificamos que os valores máximos a atribuir no procedimento concursal se situavam apenas nos 5 euros por hectare, é mais do que evidente a total insensibilidade e o alheamento por parte da entidade que gere o FFP, o ICNF – Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, para os problemas do minifúndio e para as dificuldades inerentes ao trabalho de extensão rural.
Face a este cenário nada favorável, espera-se agora que durante o corrente ano surjam novos apoios, desta vez já com uma dotação orçamental que não só sinalize o empenho do Governo na promoção da gestão conjunta do minifúndio, mas também conceda valores que suportem adequadamente os esforços de quem promove a (nem sempre fácil) colaboração entre os proprietários rurais.
Numa altura em que estão prestes a ser definidas as medidas destinadas a apoiar uma gestão florestal que tenha em conta os riscos das alterações climáticas no âmbito das verbas da Política de Desenvolvimento Rural da União Europeia para o pós-2020, há que repensar todo o modelo de apoio ao investimento na floresta, já que o mesmo fracassou.
Há, pois, que concentrar os financiamentos em projetos de gestão conjunta, onde o investimento na promoção de espécies autóctones e a remuneração anual dos serviços de ecossistema prestados pelas florestas autóctones e pela existência de descontinuidades de biomassa e compartimentação dos espaços florestais nas paisagens rurais tenha prioridade.
Não é possível manter uma lógica de mercado na gestão florestal, dependente apenas do crescimento da espécie escolhida, uma situação que tem favorecido apenas exploração do eucalipto ou a indiferença dos proprietários, sob pena de continuarmos a assistir ao incremento da área ardida, do desemprego nas áreas rurais e da perda de valor do património florestal.