“They paved paradise and put up a parking lot” – Joni Mitchell
Não é possível defender a ideia de que existem poucos lugares para estacionar em Lisboa quando sabemos que entram na cidade cerca de 370 000 carros todos os dias. E só entram porque os condutores sabem que os vão estacionar em algum lado.
Se somarmos estes carros aos cerca de 350 000 que existem na cidade ficamos com uma ideia aproximada da enormidade de espaço que concedemos a carros parados. E não nos tranquilizemos por muitos desses lugares serem em garagens, ainda que privadas, porque os custos estão lá.
Desde logo os custos associados ao uso desmesurado do carro. Sem tantos lugares para estacionar a circulação de carros em Lisboa seria muito mais reduzida. Para cúmulo só a procura de lugar e as manobras para estacionar em grandes cidades são dos principais responsáveis por congestionamentos do tráfego e mais poluição.
Hoje é aceite que o estacionamento em excesso, um favor, mais um, que se fez à indústria automóvel, está a prejudicar a vida nas cidades e de quem lá vive e trabalha. Além de consumir espaço vital, desde logo às mobilidades suaves, é o fator que mais contribui para a circulação automóvel. Sem garantia de conseguir estacionar o condutor não usa o carro e procura uma alternativa, que até pode ser um outro carro, mas partilhado.
A nova luta das cidades
Zurique foi uma das cidades que percebeu, a tempo, o conceito de parking minimus. Em 1996 definiu o “compromisso histórico” em relação ao estacionamento proibindo a construção de novos lugares de estacionamento, públicos ou privados, à superfície ou subterrâneos.
Os estudos sobre o impacto nefasto do estacionamento nas cidades aumentam, e podem ser lidos de forma resumida no artigo “The Many Costs of Too Much Parking” disponível no site da Strong Towns.
Outro estudo sugere que, em média, as cidades entregaram cerca de 55% do espaço ao carro. Os impactos deste desperdício são enormes, e ignorados pela generalidade das pessoas. É espaço que poderia ser usado para construir mais casas, baixando o preço, para jardins, espaços desportivos e de lazer, mais áreas pedonais, sem prejudicar a mobilidade cada vez mais assegurada por modos alternativos e partilhados.
O ‘San Francisco’s Smart City Challenge’ é, talvez, um dos mais ambiciosos planos que uma cidade está a desenvolver para tirar os carros da cidade e devolver a cidade às pessoas. Timothy Papandreou declarou recentemente ao Washington Post: “We can move the same amount of people with a tenth of the vehicles. We’re not going to need to have all that excess road space.”.
Estacionamento desnecessário aproveitado de forma útil
Um estudo da ‘Farrells and WSP|Parsons Brinckerhoff’ reinventou Londres e provou que era possível criar mais cerca de 20% de espaço disponível para construção só pela remoção de parques de estacionamento desnecessários, caso se implementassem medidas firmes de mobilidades partilhadas. Nos EUA o economista Donald Shoup (UCLA) demonstrou que a valores de mercado o uso gratuito de estacionamento equivale a um subsídio escondido de 127 biliões de dólares/ano.
Por tudo isto é evidente que o estacionamento de carros em cidades é um dos temas menos tratados, menos estudados, menos conhecidos no nosso País, não espantando que seja uma das vertentes mais ineficientemente geridas pela generalidade das autarquias.
Durante décadas as pessoas foram viciadas numa mobilidade automóvel perigosa e insustentável, e com isso se desinvestiu em transportes públicos e na pedonalização. Felizmente as novas gerações começam a perceber os benefícios de andarem de carro sem terem de o comprar, de o manter, de o estacionar, e nem sequer de o conduzir. Haja alguém que olha para uma cidade e exige que seja muito mais do que um enorme parque de estacionamento.