Chegou o primeiro automóvel elétrico popular. Depois de uma viagem de comboio de Lisboa ao Porto e um passeio de elétrico antigo na Invicta, foi com as baterias bem carregadas que o Adelino se sentou ao volante do Dacia Spring.

Com que então, comboio e elétrico antigo… Uma viagem muito sustentável…

É verdade. Um excelente programa da Dacia Portugal, que optou por levar os jornalistas no meio de transporte mais eficiente e sustentável para este tipo de viagens: o comboio.

Depois, o passeio de elétrico antigo foi um toque de charme muito apreciado por todos. Incluiu também uma visita ao Museu do Carro Elétrico da STCP. Foi ali que decorreu a conferência de imprensa de apresentação do Dacia Spring, o primeiro elétrico popular do mercado.

E que tal, à primeira vista?

O Spring é um automóvel do segmento A, como o Renault Twingo e o Fiat Panda. É mais pequeno ao vivo do que dá a entender nas fotos. Tem pouco mais de 3,7 metros de comprimento, boa altura para os passageiros atrás e à frente, mas talvez um pouco estreito. A capacidade da mala é surpreendente, com 290 litros e 620 com os bancos traseiros rebatidos.

Quanto ao aspeto exterior, tem muitas superfícies curvas e não são visíveis grandes poupanças na carroçaria. O modelo estático era branco, mas penso que resulta melhor em cinzento. Eram só estas as cores disponíveis na apresentação.

Nota-se que as rodas são pequenas para o padrão atual da indústria, mas estão integradas nas linhas do Spring e nas suas dimensões.

Algum detalhe interessante na informação revelada?

Vários. Foi uma conferência bastante esclarecedora, tanto no posicionamento e resultados da Dacia, como quanto ao produto Spring, que se tornou o elétrico mais acessível do mercado.

A marca tem 16 anos, está presente em 44 países e já produziu mais de sete milhões de veículos. Outro ponto interessante é de que é líder na Europa e em Portugal na venda a particulares.

Os seus modelos mais emblemáticos são o Logan e o Duster, lançados respetivamente em 2004 e 2010. Ficou bem patente que a expectativa é que o Spring se torne também um marco equivalente na história da Dacia.

E quais as qualidades do Dacia Spring para alcançar esse feito?

Pode parecer um pouco redundante sublinhar, mas o Dacia Spring é, antes de mais, um Dacia. Isso significa que é um automóvel dentro dos padrões de modernidade, cumprindo todas as regras, mas sem fantasia ou adereços supérfluos.

O baixo custo de aquisição e manutenção e a simplicidade aliada à fiabilidade, são o segredo de sucesso da marca. O Spring vem juntar a essas características o facto de ser elétrico. Simples, competente, acessível e… elétrico. Parece fácil, mas até agora, ninguém conseguiu.

E a Dacia conseguiu?

Acho que sim. E não fui só eu a achar. A viagem descontraída de comboio também tem essa vantagem e permitiu trocar impressões com outros jornalistas. Acho que ficámos todos surpreendidos pela positiva.

Mas, para muitos, ajudou o facto de as expectativas serem muito baixas.

Mas relativas ao desempenho?

Sim. Apesar de se saber que o elétrico popular da Dacia seria um citadino puro, 33 kW (44 cv) de potência era um valor baixo quando comparado com a potência média de um citadino atual, que deve rondar os 70/80 cavalos.

Além disso, falava-se numa aceleração dos 0-100 km/h em 19,1 segundos, o que também não era muito animador.

E esses números confirmaram-se?

Sim, são números reais. Mas a surpresa é que nem damos conta. Um dos truques é o baixo peso. Este é também o VE de quatro lugares mais leve do mercado: 970 kg. O outro está no binário instantâneo de 125 Nm, que torna este elétrico popular bastante desenvolto até aos 80 km/h. Velocidade mais do que suficiente para circular airosamente em ambiente urbano e suburbano.

Também aqui os opções da Dacia se revelaram adequadas. É que, no reverso da medalha, temos um elétrico com alcance otimizado para uma bateria de 27,4 kWh.

O valor em WLTP é de 230 km (que corresponde a 11,9 kWh) e em WLTP city, 305 km (9 kWh).

Mas nós sabemos que esses valores não são reais…

Pois, mas é curioso que a honestidade do produto parece abranger estas promessas. Vou contar a minha experiência no Porto.

Fizemos dois percursos de cerca de 50 km, sempre com o mesmo Spring. Ambas as etapas envolviam estrada nacional, cidade, rotundas e semáforos, com cerca de cinco quilómetros em auto-estrada ou via rápida.

Optei por andar sempre em modo Eco, que limita ainda mais a potência disponível a 22 kW (33 cv) e a velocidade máxima a 100 km/h (em vez dos 125 km/h em modo normal). Também mantive o AC desligado..

Fui o segundo a chegar ao destino na primeira etapa, e o primeiro a concluir a segunda etapa. A velocidade média foi de 49,4 km/h. Comecei com 100% de carga e terminei com 59% após 102 km. O computador de bordo indicava ainda um alcance adicional de 149 km.

O meu consumo foi de 11,8 kWh, uma décima abaixo do WLTP, permitindo uma autonomia efetiva de 232 km. Podia ter sido menos, sacrificando um ou dois quilómetros de média. Mas houve quem fizesse 12,6 kWh/100 km em modo normal e com AC ligado.

É importante também salientar que os exemplares disponíveis eram protótipos e que o desempenho dos modelos de produção pode ainda ser melhorado. Mas, para já, o resultado não podia ser melhor…

E para carregar, quais são as opções disponíveis?

O Dacia Spring pode carregar em AC e DC, com potências relativamente baixas, mas adequadas ao tamanho da sua bateria. O carregador de corrente alterna no automóvel tem uma potência de 6,6 kW, que permite uma carga completa com uma wallbox de 7,4 kW em menos de cinco horas, de 3,7 kW em 8h30 e, numa tomada doméstica, a 2,3 kW, em 14 horas.

Em corrente contínua, aceita carga até 30 kW de potência, permitindo carregar de zero a 100% em 1h30.

A possibilidade de carregar em DC é um opcional só disponível na versão Confort Plus. Custa €550, mas aumenta a versatilidade de carregamento do Spring.

A Dacia explicou porque optou por potências baixas de carregamento?

Neste produto, cada euro na produção tem um impacto importante no preço final. Os componentes necessários, por exemplo, um carregador embarcado de 11 ou 22 kW e respetivos inversores, são muito mais dispendiosos do que a solução proposta.

Em DC, consideraram que, visto que 30 kW de potência permite um tempo de carga adequado para uma bateria pequena, não valia a pena investir em potências mais elevadas.

Para um utilizador que carregue em casa, com a ocasional necessidade de carregar fora, é uma solução equilibrada. Mas para as empresas, os 6,6 kW em AC podem limitar a eficiência de um carregamento à hora de almoço, por exemplo.

Mas este também é um produto para empresas e outras entidades?

Sem dúvida. Aliás, a especificação dos protótipos em que andámos era a Business, que não vai ser vendida ao público. É dirigida a grandes frotas e car sharing. E em 2022 vai haver uma versão Cargo, de apenas dois lugares. Terá 1100 litros de volume disponível para carga com peso de até 325 kg. Será ideal para entregas em ambiente urbano, sobretudo as entregas de último quilómetro.

E confirma-se o preço revolucionário deste elétrico popular?

Sim. São €16.800 para a versão Confort. A Dacia não poupa nos dispositivos de segurança nem nas ajudas à condução disponíveis e exigíveis atualmente.

Os opcionais para esta versão são o pneu suplente (€100), o cabo FlexiCharger 16A para carregar em casa (€350) e a pintura metalizada (€400).

A versão Confort Plus custa mais €1500 e tem sistema multimédia Media NAV 7″, câmara de marcha atrás, apontamentos gráficos em cor de laranja e o pneu sobresselente.

No interior, destaca-se ainda o revestimento dos bancos em pele sintética. Nos opcionais ficam apenas o carregador de carga rápida de 30 kW (€550), a pintura metalizada e o cabo FlexiCharger. Com todos os opcionais, o preço máximo possível é inferior a €19.600.

Nota-se muito que é um produto low cost?

No interior estamos rodeados de plásticos duros e a ergonomia está longe de ser referência. Há botões espalhados um pouco por todo o lado, o que requer um pouco de habituação. O volante não é regulável, mas até está numa posição bastante aceitável.

O objetivo é que tudo seja mais funcional do que estético, com alguns discretos apontamentos gráficos que suavizam a austeridade no habitáculo. Este é um pouco estreito, mas com dimensões adequadas para quatro adultos.

Por outro lado, destaca-se o desempenho e eficiência energética, com nota positiva também para a carroçaria. Com os apontamentos de estilo do Confort Plus, fica um pequeno SUV bem conseguido e vistoso.

E em termos dinâmicos?

O Dacia Spring é muito leve e tem umas rodas pequenas, de apenas 14 polegadas. As dimensões dos pneus 165/70, com um perfil alto para os dias de hoje, torna o rolamento muito confortável. As unidades ensaiadas tinham os pneus chineses Linglong Green Max, com um desempenho aceitável dadas as capacidades do Spring. São pneus com um preço a rondar os €40 cada, em linha com o espírito poupado do Dacia.

Nas zonas mais sinuosas, sente-se o adornar significativo da carroçaria, mas um centro de gravidade relativamente baixo concorre para manter as rodas bem no chão e tudo a apontar para onde queremos. Sem surpresa, a um ritmo mais vivo e com transição de apoios, são as limitações do conjunto que tornam a condução, digamos, desafiante. Divertido para alguns, mas não me parece que o utilizador típico dos Dacia investigue, pelo menos voluntariamente, este território.

Todavia, uma boa prova de que o seu comportamento é competente é um ensaio recente que mostrou o Dacia Spring a completar o teste do alce com uma velocidade de entrada de 77 km/h, sem que nenhuma das suas rodas descolasse do piso.

Como termo de comparação, o Honda e só conseguiu completar o teste a 75 km/h e o Porsche Taycan Turbo S, a 78 km/h. O Tesla Model X não conseguiu melhor do que 70 km/h, enquanto o Model 3 cumpriu o desafio a 83 km/h.

O que ficou por saber?

As condições de financiamento. Com as vantagens de poupança e conforto de utilização dos elétricos, este é o elétrico popular do mercado para os próximos tempos.

Vai atrair um cliente particular ansioso pelos benefícios racionais de um elétrico. As condições de aquisição, com opções de pagamento mensal razoáveis, vão dar uma importante ajuda ao sucesso do modelo.

E porque não temos já valores?

Foi uma questão que coloquei ao diretor-geral da Dacia Portugal, José Pedro Neves. A resposta é bastante simples: não há histórico para definir o valor residual, um número-chave para um plano de financiamento equilibrado para todas as partes.

A solução já existe. Como é o RCI Bank que vai proporcionar este serviço, a estimativa será feita com base nos valores residuais dos elétricos com histórico que já financiam, sobretudo, o Renault Zoe.

Os Dacia apresentam valores residuais acima da média no seu segmento e isto pode permitir um valor muito competitivo.

Haverá também soluções muito flexíveis para que, no fim do contrato, o cliente possa optar pela solução mais vantajosa, seja adquirir o veículo ou não.

E vai haver Dacia Spring para toda a gente?

Depois do nosso teste, posso praticamente garantir que não. Pelo menos, este ano. As pré-reservas já iam a caminho das 200, com 250 unidades garantidas para Portugal este ano. Já foram pedidas mais, mas é pouco provável que sejam concedidas, porque o interesse no modelo é geral em todos os mercados.

As pré-encomendas abriram no início de abril e as primeiras entregas serão feitas em setembro ou outubro.

Alguma reflexão de última hora?

Como quase todos os que olharam para os números, fiquei à espera de experimentar, para perceber se o Dacia Spring era, de facto, um citadino elétrico competente.

Em poucos quilómetros confirmei que tem toda a genica necessária para uma condução desenvolta na cidade e adequada em percursos suburbanos.

Com a versão-base a ter um equipamento perfeitamente adequado, existe finalmente um elétrico popular, com um preço real abaixo dos €17.000. Carregando em casa, é possível gastar entre €1 e €1,5 para percorrer 100 km. E, claro, as baterias têm garantia de 8 anos ou 120.000 km.

Agora estou pelo menos tão convencido de que tem tudo para mudar o panorama da indústria automóvel como quando conduzi o Tesla Model 3 pela primeira vez, em 2018. E todos sabemos como é que isso correu…

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