Rui Costa Neto
Rui Costa Neto
Professor da Faculdade de Engenharia da Universidade Lusófona / Investigador IST ID, IN+

Alguns sectores na indústria, não podem ser descarbonizados com a eletrificação, nomeadamente na combustão com temperaturas superiores a 1000 °C. O hidrogénio é a única opção viável e descarbonizada para esse fim: nomeadamente em sectores que apresentam necessidade de calor, com temperaturas entre os 1000 °C e os 1600 °C, tais como em indústrias cimenteiras, fábricas de cerâmica e tijolos e telhas e vidro, metalúrgicas.

Hidrogénio verde, o vetor energético para a economia circular

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Há vários aspetos que tornam o hidrogénio uma molécula atrativa e ultra diferenciada:

i) hidrogénio é o elemento mais abundante no universo, e um dos mais abundantes no planeta terra (10º mais abundante, 1 400 partes por milhão de massa da crosta terrestres), principalmente sob a forma de água e em compostos orgânicos, tal como a água dos seres vivos, nos combustíveis fósseis e na biomassa;

ii) o hidrogénio e os combustíveis à base de hidrogénio podem transportar energia de fontes renováveis (solar, eólica, hídrica, geotérmica, biomassa) em distâncias curtas e longas;

iii) o hidrogénio permite armazenar energia local, ao nível de pequenas vilas e aldeias e grandes cidades, e até mesmo o armazenamento ao nível nacional em pipelines. Podendo transformar a energia renovável em combustível de armazenamento de curta a longa duração (entre horas a vários meses do ano), o que permite a segurança energética em vários países, alimentar a mobilidade como combustível nos transportes, e armazenar energia como um aditivo em gasodutos de gás natural;

iv) o hidrogénio é cerca de 57 vezes mais leve que o vapor da gasolina e 14 vezes mais leve que o ar. Isto significa que, se for libertado num ambiente aberto, normalmente sobe (à temperatura ambiente de 20 °C sobe 20 metros em 1 segundo) e dispersa-se rapidamente (é o gás com a maior difusividade).

Isto é uma vantagem de segurança num ambiente exterior. Esta característica torna as potenciais fugas de hidrogénio no exterior, mais seguras relativamente a outros combustíveis libertados para a atmosfera, tais comos os vapores de gasolina o gasóleo, metano, propano, butano. Além do mais, a energia contida no mesmo volume libertado de hidrogénio, é 3 vezes menor do que o mesmo volume de gás natural, o que potencialmente vai gerar três vezes menos onda de choque devido à expansão dos gases quando ignizados;

v) alguns sectores na indústria, não podem ser descarbonizados com a eletrificação, nomeadamente na combustão com temperaturas superiores a 1000 °C. O hidrogénio é a única opção viável e descarbonizada para esse fim: nomeadamente em sectores que apresentam necessidade de calor, com temperaturas entre os 1000 °C e os 1600 °C, tais como em indústrias cimenteiras, fábricas de cerâmica e tijolos e telhas e vidro, metalúrgicas.

Além do mais, evita que as empresas paguem taxas de carbono, que atualmente estão a 80 €/ton de CO2, que representam milhares de euros gastos todos anos pelas empresas, para poderem poluir o ambiente de forma conscienciosa. Adicionalmente, o preço do gás natural está a preços muito elevados, a rondar os 100 €/MWh (à data de publicação deste artigo) e que é 5 vezes superior ao preço médio, 20 €/MWh, que apresentava nos últimos 10 anos;

vi) por vezes, a produção de energia renovável excede significativamente a procura de eletricidade, em vez de ser desperdiçada pelos operadores da rede, vendida no mercado grossista a preços próximos de zero. O excesso de energia renovável pode ser fornecido a eletrolisadores que utilizam esta eletricidade excedentária para dividir a água em hidrogénio e oxigénio através de um processo conhecido como eletrólise.

Hidrogénio esse, que pode ser comprimido e armazenado em reservatórios que já existem, numa infraestrutura que já está a ser paga, os gasodutos de distribuição de gás natural;

vii) o hidrogénio é um gás não venenoso, insípido, incolor e inodoro e é um material que é conhecido há mais de 200 anos, pela química e petroquímica;

viii) apesar da combustão do hidrogénio em ar, apresentar um poder caloríficos inferior, ser três vezes inferior à combustão do metano em ar, por um lado, torna alguma eventual explosão três vezes menos impactante, causada por alguma fuga, porque a onda sónica contem três vezes menos energia.

Por outro lado, a combustão de hidrogénio em ar (com três vezes menos calor gerado face ao gás natural) torna-se na atualidade mais vantajosa economicamente, na produção de calor, devido ao preço corrente do gás natural ser cerca de 100 €/MWh. A título de exemplo, a combustão de um 1 kg, que custa 5€, contem 33,33 kWh, e como o custo do gás natural para os mesmos 33,33 kWh custa 5,5€, demonstra que na atualidade o gás natural já é mais dispendioso, devido ao contexto de guerra.

No final, a combustão do hidrogénio em ar, gera vapor de água (um bio produto, elemento de base do ciclo da água). Em oposição, a combustão de gás natural gera CO2, gás este que é derivado de outro gás (metano) que demorou milhões de anos a formar-se, e que esteve enterrado, e que agora é repentinamente libertado para a atmosfera.

Todas esta virtudes, tornam os hidrogénio, o melhor candidato como vetor energético para implementação de uma economia circular com segurança energética sustentável.

Foto de destaque por Sime Basioli

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