“É essencial que nas próximas duas décadas se produza uma mudança rápida e decisiva no modelo de mobilidade que torne o veículo individual dispensável e o uso de modos partilhados articulados, sempre que possível e necessário, com os serviços de transporte coletivo regulares em que os serviços ferroviários asseguram a maioria das deslocações terrestres de médio e longo curso”: esta é, em síntese, a avaliação da associação Zero a respeito do modelo sustentável de mobilidade que o país deve prosseguir, isto a propósito do Plano Ferroviário Nacional – que está em consulta pública até esta terça-feira, 28 de fevereiro.
Para os ecologistas, este Plano “é, sem dúvida, um dos elementos mais estruturantes e de futuro no âmbito de uma mobilidade sustentável e na redução de emissões de gases de efeito de estufa que causam as alterações climáticas, em linha com a antecipação para 2045 ou mesmo 2040 da meta da neutralidade carbónica para Portugal”.
A esse propósito, a Zero identifica cinco sinais verdes, sete amarelos e lança a necessidade de prioridades urgentes como a Terceira Travessia sobre o Tejo, exclusivamente ferroviária, como elemento essencial de futuro:

5 sinais verdes do Plano
- “A simples existência de um plano ferroviário nacional é já um importante passo no sentido de recuperar o conceito de rede ferroviária como estrutura fundamental de um modelo de mobilidade sustentável, depois de décadas de estagnação e desinvestimento”.
- “A recuperação dos planos de construção de autoestradas ferroviárias que permitem operar serviços que competem com o transporte aéreo nas ligações até 600 km, ao mesmo tempo que reduzem substancialmente a atratividade do transporte rodoviário de passageiros no médio e longo curso, libertam espaço para a circulação de mercadorias na rede atual e permitem gerar redundâncias na rede, aumentando assim a sua fiabilidade e robustez”.
- “O facto de as novas autoestradas ferroviárias possuírem variantes que permitem aos comboios pararem nas estações de comboio atuais no centro das principais cidades que servem tem que ser visto como um enorme ganho na acessibilidade às novas redes ferroviárias”.
- “Depois de duas décadas de estagnação, é muito positiva a densificação da rede ferroviária prevista nas áreas metropolitanas, sobretudo se for bem articulada com as redes de metropolitanos e com outros modos de transporte coletivo regular em sítio próprio, modos partilhados a pedido e modos suaves”.
- “Por último, deve sublinhar-se como um sinal positivo a prevista ligação dos três principais Aeroportos Internacionais à rede de autoestradas ferroviárias, o que é muito importante para conseguir a eliminação dos voos de ligação entre Lisboa, Porto, Madrid e Faro e reduzir o uso de veículos individuais para aceder aos aeroportos, sobretudo se for possível realizar a entrega de bagagens nas principais estações ferroviárias, como acontece em vários cidades da Áustria, Suíça e Alemanha”.

7 Sinais amarelos do Plano
- “Não é dada a mesma prioridade à autoestrada ferroviária entre Lisboa e Madrid que é dada à ligação entre Lisboa e Vigo Entre os aeroportos de Lisboa e de Madrid, circulam anualmente 1,5 milhões de passageiros, sendo a rota mais congestionada a partir do aeroporto de Lisboa. Para Madrid, tem que deixar de se ir de avião e para isso precisamos de um tempo de viagem semelhante às 2h45 que é possível gastar quando viajamos de comboio entre Madrid e Barcelona que distam os mesmo 600 km que existem entre Lisboa e a capital castelhana”.
- “Ao contrário da rede metropolitana de Lisboa, que passará a contar com uma circular ferroviária – sobretudo se for possível ligar o ramal da siderurgia à segunda travessia ferroviária sobre o estuário do Tejo –, que permite a circulação rápida entre periferias e aproximar o crescente número de pessoas que habitam em territórios suburbanos da estação de metro mais próxima do destino final, para a Área Metropolitana do Porto o plano não apresenta uma solução funcional, devendo ser estudadas soluções que permitam circular entre periferias de forma rápida, cómoda e sustentável. Acresce que o número de viagens na Área Metropolitana do Porto realizado através do veículo individual é cerca de 20% superior ao que acontece na Área Metropolitana de Lisboa (AML), o que torna mais urgente a atenção a dar à densificação da rede metropolitana do norte do país”.
- “Falta uma visão clara que articule o transporte ferroviário com o transporte rodoviário de mercadorias. Um exemplo disso é a inexistência de uma ligação entre Alverca e a nova linha de Loures que ligue o MARL à rede ferroviária nacional ao mesmo tempo que cria uma variante num troço da linha do norte, extremamente congestionado. Esta visão deve ser desenvolvida tirando partido da capacidade de carga do transporte ferroviário e da flexibilidade proporcionada pelo modo rodoviário – o transporte ferroviário de camiões parece promissor, mas é necessário um programa específico que promova interfaces logísticos adequados”.
- “Falta assinalar que as linhas do Algarve e do Oeste, para além da eletrificação já prevista, deveriam receber melhorias que permitissem aumentar a velocidade comercial das composições”.
- “A articulação entre os setores mineiro e agroflorestal e a criação de um verdadeiro corredor vertical interior da rede ferroviária do país não são suficientemente desenvolvidas. Deste desenvolvimento poderia beneficiar uma estratégia para o turismo sustentável, assente no transporte ferroviário e na recuperação e articulação de muitas das linhas desativadas nos últimos 30 anos, criando ainda redundâncias na rede”.
- “A definição da qualidade dos serviços ferroviários que se pretende desenvolver na rede não está tão desenvolvida quanto necessário. O crescimento da população com dificuldades de locomoção e as exigências do trabalho remoto, por exemplo, exigem a definição de padrões na infraestrutura e no material circulante que permitam elevados níveis de serviço”.
- “Deveria, desde logo, chamar-se à atenção aos impactos paisagísticos, nos sistemas ecológicos e na saúde humana que é necessário ter em conta na escolha concreta dos traçados e na exigência das medidas de mitigação adequadas”.
4 prioridades mais urgentes
“Terceira Travessia sobre o Tejo, exclusivamente ferroviária que permita fechar a circular ferroviária da Área Metropolitana de Lisboa (AML), reduzir meia hora em todas as viagens de e para o sul do país, ligar de forma mais rápida os portos do sul do e as plataformas logísticas do norte da AML e, finalmente, permitir aproximar a ligação entre Lisboa e Madrid das 3 horas”.
“Sincronização entre serviços é crucial para reduzir os tempos de espera entre transbordos e melhorar de forma decisiva a atratividade do transporte ferroviário”.
“Linhas circulares. Quadruplicação da Linha de Cintura de Lisboa, Ligação da Linha de Cascais a Alcântara-Terra e duplicação da Linha de Leixões”.
“Interfaces com os Metropolitanos. Nas estações de Campolide e Chelas, fazendo da linha vermelha uma alternativa à circular ferroviária, sobretudo para quem vem da linha de Sintra; interfaces entre estações da Linha de Leixões e as estações de metro mais próximas, começando pelas que servem grandes centros hospitalares e universitários”.