Terminou esta semana, dia 29 de abril, o período de consulta pública ao Estudo de Impacte Ambiental (EIA) do projeto de Reforço do Abastecimento de Água ao Algarve a partir da Solução de Tomada de Água no Pomarão.
O projeto prevê a construção de uma captação superficial na zona estuarina do rio Guadiana, localizada a montante do Pomarão, com conduta adutora até à albufeira de Odeleite, percorrendo os concelhos de Mértola, Alcoutim e Castro Marim, numa extensão total de condutas que varia entre 37 e 41 quilómetros, em função da alternativa de traçado.
A captação de água no Pomarão é uma das medidas definidas no Plano Regional de Eficiência Hídrica do Algarve para a qual estão previstos 61,5 milhões de euros do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) 2021-2026. Além desta medida fazem também parte da Componente C9: Gestão Hídrica, do PRR, a construção da futura estação de dessalinização do Algarve e o investimento na redução das perdas de água no setor urbano, perfazendo um investimento total de 237 milhões de euros, dos quais somente 44 milhões são destinados à melhoria da eficiência no uso da água.
O contributo desta captação deverá ser, em média, de 16 a 21 hm3 de água através de um regime de exploração da captação durante 7 meses por ano, entre outubro e abril, devendo o bombeamento parar nos meses excecionalmente secos e quando, em acumulado, desde o início do ano hidrológico, for atingido um total anual de 30 hm3 ou for atingida a capacidade de armazenamento útil do sistema Odeleite-Beliche (164 hm3).
A associação ambientalista Zero denuncia, contudo, que, “contrariamente ao preconizado na Diretiva Quadro da Água relativamente à necessidade de implementação de estratégias capazes de tornar os usos e consumos de água mais sustentáveis, prossegue-se numa lógica de aumento da captação e retenção de um recurso escasso para fazer face a consumos insustentáveis através de projetos que fomentam um aumento da procura por esse mesmo recurso”.
Mais consumo e mais desperdício, critica Zero
Para esta associação, “este é mais um projeto que ilustra esta lógica de pensamento e de atuação ao intervir diretamente sobre as massas de água para captação de caudais adicionais destinados a aumentar a retenção/armazenamento de água, não só com o objetivo de garantir que não falta água às populações, mas que simultaneamente pretende garantir que a agricultura praticada na região continua a dispor dos caudais necessários para manter ou, até mesmo aumentar, os seus níveis de consumo e desperdício”.
Projeto depende da libertação de caudais adicionais de Alqueva
A associação Zero salienta que, embora o EIA refira que ‘em qualquer circunstância, o regime de exploração da captação assegurará sempre os caudais ecológicos devidos na secção do Pomarão, estabelecidos na sequência do licenciamento do Empreendimento de Fins Múltiplos do Alqueva, que são lançados na barragem de Pedrogão, assim como os caudais estabelecidos e a estabelecer na Convenção de Albufeira’ há que considerar que a captação no âmbito do projeto carece da concordância da entidade responsável pela gestão do Empreendimento de Fins Múltiplos de Alqueva, Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas do Alqueva, S.A. (EDIA), uma vez que será da responsabilidade desta entidade a libertação dos caudais adicionais necessários para fazer face aos caudais ecológicos e simultaneamente às necessidades de captação. Esta entidade tem vindo a público declarar que um reforço nos caudais libertados por Alqueva coloca dificuldades acrescidas na gestão da água armazenada pelo que, não há qualquer garantia de que esses caudais venham a ser libertados ficando em causa os caudais ecológicos atualmente libertados.
A Zero lembra ainda que a captação do Pomarão carece de negociação com Espanha no âmbito da Convenção de Albufeira: “Apesar do Estudo de Impacte Ambiental (EIA) desvalorizar os possíveis impactes transfronteiriços do projeto, há que salientar o facto do mesmo carecer de negociação no âmbito da Convenção de Albufeira, pelo que qualquer avanço sem a prévia negociação irá colocar o projeto numa posição de ilegalidade, à semelhança do que já acontece com a captação Boca-Chança, realizada por Espanha, localizada a jusante do local previsto para a tomada de água do Pomarão”.
Explicam os ambientalistas que, ao abrigo da Convenção de Albufeira, que regula a utilização de água nas bacias partilhadas, foram definidos regimes de caudais mínimos trimestrais e anuais na passagem de cada rio pela fronteira, “no entanto, tal não foi acordado no local onde o Guadiana volta a ser fronteira – no Pomarão/Chança – o que, nos termos da Convenção, deveria ter ocorrido até 2002 para gerir a situação ambiental do Estuário do Guadiana”.
61,5 milhões de euros do PRR para este projeto
Refere a Zero que, atualmente, Espanha já possui uma captação na foz do rio Chança, destinada a abastecer regadios intensivos em Huelva, estando em curso a captação de 75 hm3 e existindo por parte das autoridades espanholas a intenção de reforçar a captação para os 150 hm3.
Perante o acima exposto, a Zero manifestou o seu parecer desfavorável ao projeto de Reforço do Abastecimento de Água ao Algarve – Solução da Tomada de Água no Pomarão, por considerar que “insiste numa lógica de aumento da oferta de água através do aumento da captação e armazenamento de água particularmente, quando todos os cenários futuros apontam para uma continua redução dos valores anuais de precipitação reforçando a necessidade de se apostar numa estratégia de longo prazo assente em soluções direcionadas para uma maior eficiência no uso da água disponível”.