Os países da União Europeia (UE) gastam anualmente entre 34 mil milhões e 48 mil milhões de euros em subsídios para atividades que prejudicam a natureza, alerta um relatório da organização ambientalista WWF.
O estudo da organização internacional “World Wide Fund for Nature” (WWF), que em Portugal trabalha com a Associação Natureza Portugal (ANP/WWF), indica que até 60% do financiamento da Política Agrícola Comum (PAC) da UE, num total de 32,1 mil milhões de euros anuais, é gasto pelos países em atividades que incentivam uma “agricultura insustentável em grande escala”.
O relatório da WWF, intitulado “O seu dinheiro pode fazer melhor? Redirecionar subsídios prejudiciais para promover a resiliência da natureza e do clima”, contém também casos de estudo, um deles em Portugal, sobre a barragem do Pisão.
“Numa zona caracterizada pela desertificação e escassez de água, este projeto visa dar resposta a estas questões, mas sem uma avaliação adequada dos seus impactes ambientais e sociais. Para além de o projeto não ter sido submetido a uma avaliação “Do No Significant Harm” (Não Causar Danos Significativos), obrigatória pela legislação da UE, também a avaliação do impacto ambiental (AIA) não mostra uma análise suficiente dos vários impactos, incluindo a qualidade da água e dos solos, disponibilidade, escassez e riscos de seca. As preocupações ambientais sobre as repercussões ambientais da barragem do Pisão são crescentes entre cientistas e especialistas na matéria, já que potencia a redução dos nutrientes, sedimentos e do caudal de água a jusante, que afectam negativamente a biodiversidade e a saúde dos ecossistemas, e a degradação da qualidade da água e do solo através da poluição difusa proveniente dos novos sistemas de irrigação”, refere a associação.
“Estas práticas devastam os habitats naturais, ao mesmo tempo que prestam um apoio mínimo aos agricultores para uma transição justa para práticas sustentáveis e resistentes ao clima”, diz a ANP/WWF num comunicado a propósito do estudo.
Além da agricultura, as subvenções diretas para outros setores também “contribuem significativamente” para a perda de natureza: 59 a 138 milhões de euros são gastos com as pescas, entre 1,7 e 14,1 mil milhões de euros com as infraestruturas de transportes, e entre 1,3 e dois mil milhões de euros com infraestruturas hídricas.
“Os governos não só estão a gastar milhares de milhões de euros do dinheiro dos contribuintes para prejudicar a natureza, como também estão a prejudicar os esforços da UE para a proteger e recuperar, em conformidade com os seus objetivos e compromissos internacionais”, afirma Ângela Morgado, diretora executiva da ANP/WWF.
A responsável considera também que se esses subsídios fossem redirecionados podia-se facilmente “colmatar o défice de financiamento” necessário para atingir os objetivos em matéria de biodiversidade e clima.
“Para melhor combater as alterações climáticas e continuar a fornecer água potável às populações locais, temos de redirecionar os subsídios que prejudicam a natureza. É urgente utilizar o financiamento público da UE para apoiar alternativas que garantam o abastecimento seguro de água potável e a sustentabilidade dos sistemas de irrigação existentes, em vez de financiar projetos que prejudicam a natureza e as pessoas”, acrescenta Ângela Morgado.
Segundo os ambientalistas, “esta má afetação de fundos dos países da UE contrasta fortemente com as necessidades identificadas na Estratégia de Biodiversidade da UE para 2030, que exige uma estimativa de 48 mil milhões de euros anuais para financiar atividades de agricultores, proprietários de terras e comunidades rurais e costeiras para proteger e restaurar eficazmente a biodiversidade”.
A organização internacional insta os governos e a UE a estabelecerem um quadro juridicamente vinculativo para garantir uma “eliminação gradual, atempada e socialmente justa” dos subsídios que prejudicam a biodiversidade e a redirecioná-los para soluções baseadas na natureza que possam proteger melhor as pessoas dos impactos climáticos.
E apela aos políticos para que intensifiquem as ações destinadas a acabar com a dependência da UE em relação aos combustíveis fósseis, a dar prioridade à natureza e a corrigir o sistema alimentar em rutura, sem deixar ninguém para trás.