A degradação do solo está a “afetar silenciosamente” a qualidade nutricional dos alimentos, tendo um impacto negativo na saúde mental e no bem-estar geral, segundo uma análise do movimento “Save Soil” divulgada no Dia Mundial do Solo que se assinalou esta quinta-feira, 5 de dezembro.

A associação ambientalista Zero defendeu hoje a criação de legislação que controle a venda de terrenos potencialmente contaminados, condicionando-a a um relatório sobre o estado de contaminação do solo.

Seria fundamental que “fosse publicada legislação que estabelecesse a obrigação de condicionar a venda de terrenos – onde estiveram instaladas atividades de risco de poluição do solo – à apresentação de um relatório com o estado da contaminação desse solo, pelo proprietário, ficando assim responsável pelos eventuais custos de descontaminação”, diz a associação.

Quando se assinala o Dia Mundial do Solo a Zero acrescenta que essa legislação reduziria a ocorrência de situações em que os novos proprietários se veriam confrontados com um terreno contaminado, sem poder já responsabilizar o anterior proprietário pela descontaminação.

Em comunicado, a Zero refere que essa obrigação estava prevista na “Prosolos”, uma lei sobre prevenção da contaminação e remediação dos solos que está pronta há nove anos mas que nunca foi publicada, apesar de sucessivas promessas dos governos, e apesar de a consulta pública ter indicado um apoio generalizado à publicação, assim como a Assembleia da República.

A Zero diz ter contactado o Ministério do Ambiente e Energia sobre a “Prosolos”, que disse não ir avançar com a legislação por estar a ser discutida a nível europeu uma Diretiva sobre a Monitorização do Solo.

“A Zero compreende esta posição, mas considera que essa possibilidade não é razão suficiente para não se avançar, desde já, com uma medida prevista no Prosolos relativa ao controlo da venda de terrenos com solos potencialmente contaminados e já transmitiu ao Governo esta proposta”, diz a associação no comunicado.

A análise, que coloca os agricultores e a agricultura regenerativa “no centro da solução”, tem como título “Solos saudáveis, seres humanos saudáveis”.

“A saúde dos nossos solos está intrinsecamente ligada à nossa saúde física e mental. Ignorar a degradação do solo não é apenas uma questão ambiental; é uma ameaça direta à saúde pública global”, afirma Praveena Sridhar, diretora técnica da “Save Soil”, um movimento global de defesa do solo e de apoio à agricultura regenerativa.

A análise é divulgada no Dia Mundial do Solo, que hoje se assinala, numa altura em que decorre em Riade, na Arábia Saudita, a 16.ª conferência da ONU de combate à desertificação, a COP16. “A matéria orgânica do solo é fundamental para solos saudáveis e vivos, e a sua recuperação deve ser um ponto-chave da agenda da COP16”, refere Praveena Sridhar.

No âmbito da COP16 uma coligação de 60 organizações não-governamentais vai entregar à ONU um documento instando os líderes mundiais a restaurar a saúde do solo, como uma “prioridade ecológica e de saúde pública”.

O documento alerta para o facto de 40% do solo mundial estar degradado e de 90% da camada superficial do planeta poder vir a degradar-se até 2050, “pondo em causa a produção e a qualidade dos alimentos para uma população mundial que deverá atingir os 10 mil milhões de habitantes”.

a “Save Soil” refere “que 58% das terras portuguesas estão em risco de desertificação”.

Nesta análise diz-se que um solo rico em matéria orgânica conduz a um maior rendimento das culturas e a uma melhor qualidade nutricional dos alimentos, alertando que o declínio contínuo da saúde do solo está a contribuir diretamente para a perda nutricional dos alimentos. O teor de proteínas no trigo, por exemplo, diminuiu 23% de 1955 a 2016.

Além de que os alimentos ricos em nutrientes apoiam o microbioma intestinal, afetando a saúde física e mental, a análise nota que o contacto com o solo pode melhorar a saúde intestinal, e que a degradação do solo está a acelerar a subnutrição a nível mundial, em especial a fome oculta, quando a qualidade dos alimentos não satisfaz as necessidades nutricionais.

O estudo destaca que solos saudáveis são essenciais para a saúde mental, que a falta de micronutrientes essenciais como B1, B6 e B9 (devido à má saúde do solo) estão associados à depressão, e que solos degradados estão relacionados com deficiências de magnésio, ferro e zinco, ligados ao bom funcionamento neurológico.

A análise sublinha que a fome oculta afeta mais de 50% das crianças com menos de cinco anos e 66% das mulheres em todo o mundo.

O Dia Mundial do Solo, criado pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 2013, destina-se a sensibilizar para a importância crítica do recurso natural que é o solo, alertando para a necessidade de solos saudáveis.

Este ano o lema do dia é “Cuidar dos Solos: Medir, Monitorizar, Gerir”, sublinhando a importância de dados e informações exatos sobre o solo para compreender as características e tomar decisões sobre a gestão sustentável.

Celebrando a data, a Sociedade Portuguesa das Ciências do Solo anunciou hoje o barro como o “Solo do Ano 2025”.

A iniciativa “O Solo do Ano” pretende divulgar a diversidade e importância dos solos portugueses e os barros são um dos solos mais férteis e escassos do país, explica a Sociedade em comunicado, salientando também que os solos são sistemas vivos e dinâmicos, caracterizados por uma notável diversidade.

Os barros, diz também, são solos evoluídos, profundos e ricos em argila, pelo que têm grande capacidade de retenção de água e nutrientes e um elevado potencial de fertilidade.

Em Portugal Continental os barros ocupam cerca de 1% do território e estão essencialmente em pequenas áreas na região da Grande Lisboa e no Baixo Alentejo, ocorrendo também em manchas menores espalhadas a sul do Tejo.

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