Os ambientalistas da Zero organizaram uma ação simbólica junto ao Ministério do Ambiente e Energia para alertar o Governo para a urgência de se adotar uma gestão integrada, responsável e sustentável da água.
O alerta surge numa altura em que os elementos orientadores para as futuras políticas nacionais da água estão a ser ultimados pelo Grupo de Trabalho designado para elaborar a Estratégia “Água que Une”, “sem que o processo tenha envolvido adequadamente os vários setores da sociedade, incluindo as Organizações não Governamentais (ONG), e sem uma Avaliação Ambiental Estratégica, lacunas que podem comprometer a sustentabilidade dos recursos hídricos e o equilíbrio dos ecossistemas no futuro”, refere a Zero.
A política nacional da água não pode vir a ser um “Bicho de Sete Cabeças”, exige a Zero.
Durante a ação foi apresentada a instalação de um “Bicho de Sete Cabeças”, constituído por materiais diretamente ligados à gestão ou ao consumo da água como tubos, mangueiras, passa-muros, gotejadores e garrafas de água, sendo que cada cabeça pretende ilustrar os sete pecados capitais que, na perspetiva da Zero, são resultantes das atuais políticas nacionais para a água e “que devem ser, de imediato, abandonados”.
Esses problemas vão desde o uso excessivo de água para alimentar uma agricultura intensiva assente em culturas permanentes até à degradação da qualidade das massas de água ou o negligenciar a importância da água para as gerações futuras.
Para a Zero, estes são os 7 pecados capitais do país em matéria de água:
- Gula: a excessiva captação de água para alimentar uma intensificação agrícola assente em monoculturas permanentes, criando pressões sobre os recursos hídricos superficiais e subterrâneos, tanto na quantidade quanto na qualidade;
- Avareza: os benefícios privados à custa de prejuízos públicos quando se refere ao suporte do custo final da água e os impactes dos modelos de produção agrícola favorecidos;
- Luxúria: uso desmedido da água para suportar um modelo de desenvolvimento que não é compatível com as atuais disponibilidades hídricas, sobretudo em regiões com escassez hídrica e com grande dependência do turismo, de que são exemplo o Costa Alentejana e o Algarve;
- Preguiça: falta de investimentos na eficiência hídrica evidenciada pelas elevadas perdas na agricultura (35-40%) e no setor urbano (30%), assim como na adoção de soluções baseadas na natureza;
- Ira: degradação da qualidade das massas de água e dos serviços de ecossistemas;
- Inveja: distribuição desproporcional entre usos setoriais (agricultura/uso urbano), intrassectoriais (distribuição entre agricultores e entre sistemas agrícolas) e entre regiões sujeitas a escassez hídrica;
- Soberba: negligência da importância da água para as gerações futuras passando a falsa mensagem de que o recurso é infinito.
Para destacar a necessidade urgente de mudança nas políticas, a Zero ofereceu à Ministra do Ambiente e Energia o “Cabaz das Políticas com Futuro”, o qual contém um conjunto de objetos que simbolizam os elementos fundamentais para a definição de políticas para a água que impactem positivamente o futuro:
- Redutor de caudal: reconhece que é estratégico definir as políticas assumindo a necessidade de priorizar a eficiência hídrica, a regulação da procura e a aplicação do princípio do utilizador-pagador;
- Ampulheta: simboliza o tempo enquanto fator crucial para a definição e execução das políticas – por um lado é necessário permitir uma janela temporal adequada para que haja uma discussão alargada das prioridades da política pública e, por outro, existe a urgência de garantir adaptação às alterações climáticas;
- Mealheiro: lembra que os recursos públicos são limitados, devem ser poupados e não devem ser utilizados em áreas de prioridade duvidosa;
- Ábaco: reforça a importância de calcular se os investimentos a realizar apresentam uma boa relação custo-benefício e ponderam adequadamente as alternativas, sem causar injustiça social, e a necessidade de garantir que o verdadeiro custo da água é repercutido junto dos utilizadores/consumidores;
- Conserva de cavala: lembra a necessidade de implementar os caudais ecológicos, a continuidade fluvial e a adequada gestão dos sedimentos para que as águas costeiras e de transição (estuários, rias, lagunas costeiras) mantenham a sua produtividade biológica;
- Sobreiro: reconhece que o ciclo hidrológico começa na ocupação e uso dos solos, pelo que se exige um correto ordenamento do território e uma valorização ambiental dos sistemas florestais e agrícolas;
- Leguminosas secas: destacam a importância de garantir um grau adequado de auto-aprovisionamento de bens alimentares estratégicos, como é o caso das leguminosas secas (auto-aprovisionamento a 14% na campanha 2022-23), sendo que os projetos de regadio público devem contribuir para a soberania alimentar do país e garantir a transição para dietas mais sustentáveis.
“Ainda que a Estratégia possa já estar numa fase avançada, a Zero apela ao Governo para que não caia na tentação de criar um verdadeiro “Bicho de Sete Cabeças”, que resultante de políticas públicas desastrosas. Para não comprometer negativamente o futuro exige-se a não inclusão de um conjunto de medidas de “fim de linha” como: aumento desenfreado das áreas de regadio, transvases, dessalinizadoras, novas captações e aumento das existentes ou novas barragens, sob a falsa pretensão de serem reservas estratégicas”, afirmam os ecologistas.