A biomassa é atualmente a maior fonte de energia renovável da União Europeia (UE), mas continua a ser subvalorizada nas estratégias climáticas, que tendem a privilegiar outras fontes como a solar ou a eólica. Um novo estudo conduzido pela Universidade de Tecnologia de Chalmers, na Suécia, alerta que, sem a biomassa, a transição energética europeia poderá enfrentar custos significativamente mais elevados e entraves técnicos complexos.
A investigação “Diversity of biomass usage pathways to achieve emissions targets in the European energy system”, publicada na revista Nature Energy, conclui que excluir a biomassa do sistema energético europeu resultaria num acréscimo de 169 mil milhões de euros por ano – um valor comparável ao custo de excluir a energia eólica. O estudo analisa dois cenários: um de emissões líquidas nulas e outro com emissões negativas, e reforça que a biomassa é essencial para alcançar os objetivos climáticos da UE, quer pelo seu potencial de substituir combustíveis fósseis, quer pela capacidade de remover dióxido de carbono da atmosfera.
Biomassa: uma solução versátil e estratégica
Fontes como resíduos florestais, palha de cereais, culturas energéticas e desperdícios de madeira podem ser utilizados para gerar eletricidade, aquecimento e combustíveis renováveis, além de permitir a substituição de petróleo e gás fóssil na indústria química. A biomassa é também uma das poucas vias tecnológicas que permite a captura e armazenamento de carbono (CCS), gerando “emissões negativas”.
“Ficámos surpreendidos com a rapidez com que os custos aumentam quando se reduz a disponibilidade de biomassa no sistema energético”, afirma Markus Millinger, autor principal do estudo. “Se eliminarmos totalmente a biomassa, os custos anuais do sistema energético com emissões negativas sobem 20%. Isso equivale, em termos financeiros, a prescindir da energia eólica.”
Mesmo restringindo o uso da biomassa aos níveis atuais, o aumento de custos já ronda os 5%, o que levanta sérias dúvidas sobre a viabilidade de soluções alternativas a curto prazo. Markus Millinger alerta que o problema maior poderá não ser económico, mas sim técnico: “Escalar outras fontes de energia livre de fósseis para compensar essa ausência seria extremamente desafiante.”
Capturar carbono é mais relevante do que produzir energia
Uma das conclusões centrais do estudo é que o verdadeiro valor da biomassa reside nos átomos de carbono que a compõem, e não tanto na energia que fornece. A combinação da bioenergia com tecnologias de captura de carbono permite, simultaneamente, produzir energia e remover CO₂ da atmosfera.
“Não é essencial em que setor a biomassa é usada, desde que o carbono seja capturado e reutilizado ou armazenado”, explica Markus Millinger. “Cada país pode optar pela solução mais adequada à sua realidade, seja para produção de eletricidade, calor ou biocombustíveis.”
Implicações para a política e investimento
Os investigadores desenvolveram um modelo energético detalhado que avalia o impacto da biomassa em todos os setores da sociedade. O trabalho oferece uma nova base científica para orientar políticas públicas, em especial no que toca à criação de mercados para carbono livre de fósseis.
Contudo, a expansão da bioenergia deve ser feita com atenção aos riscos associados, como a pressão sobre florestas e solos agrícolas, perda de biodiversidade ou aumento dos preços alimentares. “O setor bioenergético opera num contexto de exigências crescentes de sustentabilidade”, sublinha Göran Berndes, coautor do estudo. “Mas, se bem desenhados, os instrumentos de política podem incentivar práticas que promovam o uso mais eficiente dos recursos e minimizem os impactos negativos.”